sábado, 6 de dezembro de 2008

Música da semana: o hip-hop clássico dos De La Soul


A banda hip-hop De La Soul, foram desde sempre o meu maior ponto de referência do género.
Os De La Soul são apenas 3 tipos, a formação clássica de DJ + 2 MCs, bem dispostos e com um enorme espirito de missão: Trugoy, plug two (nome que revertido resulta "yogurt"), Posdnuos, plug one (outro nome que ao reverter dá "sound sop") e Maseo, o plud three (e nos pratos). Apelidavam-se de plugs devido à ordem com que ligavam os seus microfones.


O registo de estreia...

O álbum de estreia,"3 Feet High and Rising" (1989), portanto lançado no final dos idos anos 80 onde o hip-hop ainda despontava e procurava a afirmação generalizada e não só apenas das elites "étnicas" que o apreciavam, foi um marco no género e ainda hoje o considero fresco.

Todo o álbum é rico em irreverência sonora, cheio de sons de muitas proveniências num autêntico estado máximo da arte de juntar samples e com eles criar ricas bases sonora que apontavam igualmente em várias direcções e ao mesmo tempo o dotava de alguns momentos intemporais. Ele era hippie flower-power, funky, jazz, festivo e dançável, sério e brincalhão como nunca se tinha visto.


"Say no go"

É um autêntico feito para uma banda que se estreia lançar um primeiro álbum que passa a ser considerado, por todo o mundo, como uma obra-prima, principalmente daquelas que mais ajudou a definir e a alargar o género do hip-hop/rap. Foram capa da NME e ganharam com o "3 Feet High and Rising" (1989) um Grammy.

A destacar faixas soberbas como "The Magic Number", "Change In Speak", "Jenifa Taught Me (Derwin's Revenge)", "A Little Bit Of Soap","Eye Know", "Say No Go", "Me Myself And I", "D.A.I.S.Y. Age" ou "Plug Tunin'".

Um dos factos mais curiosos é ter o conceito de concurso e onde as canções fazem o papel de concorrentes em audição, onde pelo meio se vão passando certas acções, desde o enunciar das regras e dos concorrentes, a uma orgia sexual (em "De La Orgee"), ao apresentarem-se ao show ("Description"), ao afirmarem a sua arte aos restantes participantes (em "Do As De La Does" e "I Can Do Anything (Delacratic)").
É daqueles albuns que não se consegue ficar indiferente e que marcou imenso quem o ouviu na altura, incluindo todos aqueles que nem se identificavam com o rap e a sonoridade hip-hop.

"Me Myself And I"



...e o registo seguinte.

Com um disco tão bom no mercado, fazer um segundo álbum seria algo mais difícil, contudo, os De La Soul conseguiram com "De La Soul Is Dead" (1991) afirmarem-se ainda mais com um registo ainda mais maduro, mais inteligente, igualmente criativo e consciente do seu estado de obra seguinte a uma obra-prima.

O ponto alto foi terem sido inteligentes ao ironizarem a situação e terem mesmo assim desejado dar mais um passo em frente e não fazerem uma repetição do mesmo. Ao mesmo tempo não lhes agradava, terem sido rotulados desde a estreia de novos hippies e com isso menorizavam as suas capacidades no rap. Temos de compreender também que o positivismo que traziam já não representava a mesma importância em 91 porque o gangsta rap estava a espalhar-se com muita rapidez e com muito mais popularidade. E tomaram medidas... 


"A Roller Skating Jam Named "Saturdays"" (com Q-Tip)


A começar pelo nome onde gozam com eles mesmo (que a banda hippie morreu), reforçado na arte do álbum onde também tentam dar fim ao rótulo de flower-hippies (na capa as flores estão confinadas à morte com a queda do vaso) e depois à lógica conceptual que empregaram ao álbum, uma rádio fictícia (a WRMS) que passa enquanto um grupo de críticos-de-cordel descobre uma cassete dos De La Soul. Um detalhe fabuloso foi terem feito dos vários skits do álbum uma banda-desenhada que os ilustra e que é para ser seguida durante a audição do álbum. Obviamente que esses críticos vão progressivamente detestando cada vez mais a audição, chegando a referir como superior artistas como Vanilla Ice (por ex) e vaticinarem a música como uma porcaria a meter directamente no lixo, principalmente por não ter armas, não falar da West Coast, não ter o palavreado de guerrilha de bandos, etc. Magnifico!

"De La Soul Is Dead", não foi tão bem sucedido como o anterior mas encerra nele uma demonstração de qualidade. Para mim, este é que é a verdadeira obra-prima dos De La Soul em todos os pontos. É um álbum menos imediato que o anterior mas ao mesmo tempo mais cativante ao longo do tempo, que não se esgota facilmente ouvindo imensas vezes e que os anos que passaram revelam que é muito melhor do que parecia quando saiu (eu adoro-o demais desde que saiu em 91).
É difícil destacar "excertos" deste álbum mas as mais imediatas passam por "Oodles Of O's" (fabulosa), "Talkin' Bout Hey Love" (inesquecível), "Peas Porridge Hot" (declaração de afirmação no rap e na música), "A Roller Skating Jam Named "Saturdays"", "Let, Let Me In" (com Maseo a rappar), "Rap De Rap Show" (com imensos convidados numa espécie de quem é quem), "Millie Pulled A Pistol On Santa", "Pass The Plugs", "Ring Ring Ring (Ha Ha Hey)", "Fanatic Of The B Word" e "Keepin' The Faith".


"Ring Ring Ring (Ha Ha Hey)"



Fazendo a ponte para os tempos de hoje, continuam fortemente no activo (ainda a semana passada estiveram em Portugal para concertos num Casino). Lançaram vários álbuns depois dos dois iniciais mas cada vez menos relevantes para a critica.
Foram ambiciosos demais quando quiseram lançar a trilogia AOI ("Art Official Intelligence", que só viu duas edições, em 2000 e 2001, respectivamente com "Mosaic Thump" e "Bionix" - a última parte ainda está por editar) mas tiveram em "The Grind Date" (2004) um novo foco de relevância e agrado dos fãs (da minha parte "Much More" é superlativa e uma das melhores de sempre da banda).


MúsicaDaSemana

4 comentários:

Anónimo disse...

Ótimo post!

Em Saturday, o refrão é cantado pela Vinia Mojica. Não entendo pq até hj ela não teve um album solo...

Aproveitando, vc poderia dar algumas dicas de hip hop português? Sei que tem muita coisa boa por aí.

Peter Gunn disse...

XXXLente post!!!

Os De La Soul eram realmente o melhor que se fazia no hip hop mais dançavel em 1990 e 1991, sendo que o album "De La Soul is Dead" é disso prova!

Priceless ;)

ArmPauloFerreira disse...

@ Peter Gunn: os álbuns tinham momentos dançáveis mas eram apenas momentos. O que surgia nas pistas de dança eram versões diferentes dos poucos êxitos/hits que tinham mas editados com apelo mais dançavel. O "De La Soul is Dead" não o acho lá muito dançável mas lá que ritmo tem isso é verdade.

ArmPauloFerreira disse...

@ Rodrigo M. Ramos: Nunca prestei atenção a essa voz...

Quanto ao hip-hop português... bom não é fácil de fazer um apanhado. Até porque há muitas opções de qualidade diversa.

Numa abordagem mais old-school começaria por citar gente como:
- General D (o primeiro rapper a lançar um registo para o mercado - só teve existência na década de 90 e tenho tudo dele)
- Da Weasel (talvez a melhor banda nacional ao vivo e que praticam um som que começou por hip-hop quase puro para algo baseado "hip-poprock")
- Mind Da Gap (a melhor banda de hip-hop puro nacional desde há muitos anos - mais de 10 anos- merecidamente já abordados neste blog (porque sou o fã deles e eles ainda nem tinham lançadao nada e tinha boas conversas com o DJ Serial- ver: http://armpauloferreira.blogspot.com/2008/02/mind-da-gap-de-regresso.html)
- Black Company (deve-se lhes muito e esforçam-se... mas... e regressaram em 2008)
- Boss AC (o mais rápido e cool rapper nacional - já teve a colaboração de De La Soul)

e depois há os novos como o excelente Sam The Kid, Valete, Dealema, etc. Ando afastado da cena actual... deve haver por aí mais malta que conhece melhor que eu este assunto.