sábado, 14 de novembro de 2009

Música da semana: Jay-Jay Johanson, discografia

Várias vezes por aqui foram apresentados artistas da cena trip-hop. Desta vez uma incursão pelo excelente trabalho do sueco Jay-Jay Johanson.

Continuo a defender a opinião que o trip-hop foi das melhores "invenções" do ramo da electrónica. Dos muitos estilos que os vários projectos foram surgindo em torno deste género musical, todos contribuiram com a sua personalidade e conceitos. Normalmente é na tríade Massive Attack + Tricky + Portishead que praticamente tudo se baseou. Afinal, só estes 3 (principalmente os Massive Attack) expandiram e experimentaram todas as vias para a fórmula do trip-hop. Mais projetos o fizeram mas não foram consistentes o suficiente para perdurarem.

O Jay-Jay Johanson quando apareceu em 1996 com o seu 1º álbum, adicionou uma nova componente que não havia ainda sido claramente explorada: o crooner de recorte clássico em base sonora trip-hop.

Jay-Jay, usava as bases sonoras muito à Portishead (a sua principal influência) e à Massive Attack (os daquela altura, quando ainda transpiravam soul e jazz), só que "vocalizava" as canções à crooner dos tempos antigos, tais como Frank Sinatra, Engelbert Humperdinck, Dean Martin, etc.
O efeito provocado pela forma como coloca a voz, entoava certa palavras e pontua as suas deixas, conferiram-lhe um lugar (quase) único no género. Ao mesmo tempo, reforçava a importância do trip-hop como um dos poucos géneros musicais capaz de resgatar para a actualidade, em modo contemporâneo, aspectos do clássico "formato-canção" que pareciam já provocar a vergonha na indústria musical.

Bastou este sueco aplicar o seu vozeirão naquelas bases sonoras, para que todo o mundo quisesse saber quem ele era. O chamariz e eterno mega-hit deste sueco foi, obviamente, a canção:

"So Tell The Girls That I Am Back In Town" (1996)


Apesar de ter saltado para o estrelato com esse magnifico tema, a sua carreira havia começada um pouco antes e ainda enquanto estudante de arte. Um dos seus trabalhos "escolares" foi todo o processo de criação musical. As canções, a encenação, o video e o recuperar arte antiga em confronto com a modernidade e as novas estéticas. Isso resultou naquele que será ainda a sua mais magnifica canção:

"It Hurts Me So" (1996)


"It Hurts Me So" é toda ela arty, com o video e canção feita com esse fim artístico, que explorava um certo conceito jazzy de gentleman com dor de corno. Dramatismo lirico, potenciado por uma rica sonoridade pontuada por um ambiente obscuro e depressivo. Não só é o seu melhor tema como também um dos mais perfeitos exemplares de todo o género trip-hop. Tudo está lá presente: os samples, os scratches, o tom de spy-movies e uma imensa tristeza nas letras em recorte clássico. O tema cresceu e foi tão popular no seu circuito artístico, que ele decidiu-se por avançar com um EP. Ora esse EP, seria depois ampliado (apesar de mesmo assim curto) e tornado depois naquele que é o seu primeiro álbum, o "Whiskey" (1996).


"Whiskey", além das duas canções já referidas, continha ainda mais algumas preciosas canções, tais como as impressionantes "The Girl I Love Is Gone", "I'm Older Now" ou "I Fantasize Of You", que se remetia todo ele à geração crooner de outros tempos.



"Tattoo" (1998)


Ao segundo registo, Jay-Jay Johanson quis provar que era mais que uma experiência artística e o seu registo musical de longa duração comprovou-o. Desta vez a base sonora, não se remetia unicamente ao trip-hop mas com derivativos deste génro polvilhado comoutros tais como leve drum'n'bass, a bossa nova, blues, breakbeats, etc. É o seu álbum mais equilibrado de todos e provou ser um claro salto na carreira e marcou a cena musical. Contém maravilhosas canções como "Even In The Darkest Hour", "Quel Dommage", "Milan. Madrid. Chicago. Paris", "Lychee" ou "A Letter To Lulu-Mae", entre outras muito boas.



"Poison" (2000)



Contudo, ao 3º álbum o estado de graça parecia estar a desvanecer, pois criativamente a sonoridade que apresentou era desta vez influyenciada por bandas-sonoras de outros tempos. Filmes clássicos hitchcockianos tal como se percebia claramente na capa do álbum. A sua veia crooner mantinha-se mas desta vez já não entoava em registo vocal grave tendo optado em momentos por cantar quase angelicalmente. Em minha opinião, Jay-Jay acusou igualmente nesta fase o facto de o género trip-hop encontrar-se moribundo, com os nomes mais sonantes do género a distanciarem-se ou a mudarem de estilo. A falta de novo material dos Portishead também pesou e este via-se unicamente a emular os meandros obscuros que os Portishead haviam apresentado no segundo álbum. Mesmo assim, "Poison" contém alguns bons temas dignos de interesse como: "Believe In Us", "Colder (I Want You No More)", "Anywhere Anytime", "Whispering Words" e princiapalmente a faixa-título "Poison" (que contém o ritmo roubado á "Seven Months" do 2º álbum dos Portishead)


"Antenna" (2002) e "Rush" (2005)



Com uma estética gasta, Jay-Jay Johanson reinventou-se e passou a criar canções pop, mais dançáveis e ambientadas no electro. Ambos os álbuns continuaram a ter um ou outro apontamento ambientado no trip-hop, só que a esta altura já nada mais era o mesmo. "On The radio" foi um enorme sucesso pop, onde este exibia a sua nova aparência esquelética e quase andrógina.

"On The radio"


"Rush" seguiu as mesmas coordenadas do anterior mas com pouco brilho e algo indistinto na sua discografia. O mais interessante destaque é a própria faixa que dá título ao álbum...



"The Long Term Physical Effects Are Not Yet Known" (2006)



Em 2006, Jay-jay virava novamente as agulhas para o seu estilo original e em grande parte semelhante a "Whiskey". Cria um excelente álbum e o regresso ao trip-hop. O álbum é esplêndido e contém alguns dos seus melhores temas de sempre. Se se fizesse um top 3 dos álbuns dele este mereceria um lugar.
"She Doesn't Live Here Anymore" é magnifica com todo o seu dramatismo obscuro e faz recordar a "It Hurts Me So" de há 10 anos antes. Há ainda algumas excursões pelo jazz e muito som cinemático. A verificar faixas como "Coffin", "As Good As It Gets" ou "Breaking Glass" que são impressionantes.


"Self-portrait" (2008)



O seu mais recente registo, do ano passado, continua a sua cruzada pelos ambientes denotado no registo de 2006, só que com uma temática mais triste e fatalista, devido ao falecimento da sua mãe.
Tem alguns bons momentos como "Lightning Strikes", "Autumn Winter Springs" ou "Medicine" mas o todo não brilha muito.

2 comentários:

My One Thousand Movies disse...

Belo texto, que me faz recuar um bom par de anos no tempo.
Eu era obcecado pelo primeiro album dele. Agora levei-o para o carro e tenho andado a ouvir em repeat :)

ArmPauloFerreira disse...

Antigamente fazia semanalmente retrospectivas musicais... e esta foi de um dos que mais aprecio.
O Jay-Jay desde que os Portishead pararam por 10 anos... ele perdeu o rumo da sua maior influencia e isso nota-se para quem conhece bem ambos.
Os dois primeiros são fabulosos...o Long Therm... recupera o nível alto dele... mas sendo fã gosto de tudo.
Mas não há nada como o Whisky... é como um bom malte antigo... uma maravilha em qualquer altura e também apela ao repeat...
Obrigado Francisco!